Você está em Diversos > Relatos

Relato do leitor

 
(02/Set) Dado Divisórios Específicos e Enraizamentos
 
Dado Divisórios Específicos e Enraizamentos

Após a narrativa da história, com os Dados divisórios tendo preenchido as lacunas que eventualmente tenham ficado, o filósofo fará dados divisórios mais específicos, isto em períodos da história que sejam relevantes ao trabalho. Alguns períodos poderão ser retomados para o enriquecimento de informações. Os dados divisórios específicos compreendem períodos mais curtos que os dados divisórios feitos anteriormente. Podemos delimitar o período do dado divisório da seguinte forma: "Gostaria que você falasse um pouco mais sobre este período de quando você decidiu o que estudar até o ano seguinte, quando você mudou de emprego". Quando o filosofo está realizando este dado divisório (específico), é natural que muitas informações se repitam, as vezes o partilhante apenas repete o que já falou, mas também acontece de já fazer, espontaneamente, um enraizamento. O enraizamento é o passo seguinte aos dados divisórios específicos.

No desenrolar da historicidade vamos montando como que uma linha cronológica da vida da pessoa, temos assim uma linha horizontal. Se na historicidade temos uma visão horizontal da vida do partilhante, ...... 5..... 7.... 8... 9... 10... 11...., nos enraizamentos teremos uma visão vertical, .... 5
.... 7
.... 8
.... 9
... 10
Pegaremos alguns eventos, ou assuntos e aprofundaremos um pouco mais. Faremos isso em vários pontos da história, serão questões relacionadas à Categoria Assunto. Ao retomar uma questão o filósofo deve tomar cuidado para não direcionar o assunto a um dos tópicos. Considere que o assunto seja, por exemplo, uma briga que o partilhante teve com alguém do seu convívio. Se o filosofo perguntar sobre o relacionamento entre eles o assunto foi direcionado para o tópico 27 - Interseção de Estruturas de Pensamentos; Se perguntar o que ele pensava, já temos um direcionamento para o tópico 3 - Sensorial e Abstrato; Se a pergunta for sobre os sentimentos, podemos ter uma resposta pelo tópico 4 - Emoções, e assim por diante. O problema do direcionamento de tópicos consiste no erro que o filosofo cometerá na hora de fazer o planejamento clínico, visto que o planejamento se baseia nos tópicos que aparecem na historicidade. Errando no planejamento, a clínica não dará resultados positivos. Portanto, temos de estimular a pessoa a falar mais sobre o assunto desejado utilizando as informações que já temos até então. Podemos repetir o que a pessoa falou, podemos pedir de forma direta que o partilhante fale um pouco mais sobre determinados assuntos, mas, sempre com o cuidado de não agendar dados (agendamentos mínimos) e nem direcionar o assunto a algum tópico. Os termos usados serão: E depois, o que houve? Continue; Fale mais sobre isso; Poderia falar sobre tal assunto? Prossiga, etc. Partindo da história que o partilhante contou, o filosofo buscará o máximo de informações relacionadas ao assunto da clínica. Este é um momento epistemológico na clínica. O filosofo vai se basear no que o partilhante falou para aprofundar algumas questões. O objetivo do enraizamento é esclarecer as questões para tirar possíveis dúvidas e confirmar dados que em um primeiro momento tenham aparecido de forma contraditória ou confusa. O enraizamento será feito em uma etapa ou mais. Quanto maior for a necessidade de aprofundar algum ponto, mais vezes o filósofo realizará o enraizamento, especificando e descendo cada vez mais fundo na questão.

O filosofo deve tomar muito cuidado com as questões que vai enraizar, há histórias que podem realmente encantar, mas o filosofo nunca pode perder de vista a postura ética e o procedimento de seu trabalho. Considere que o filosofo esteja enraizando uma questão que lhe pareça simples, e quanto mais vai aprofundando mais questões vão aparecendo e percebe-se que há um grande Iceberg escondido. O que vale considerar aqui, além da existência do Iceberg, é a relevância de se mexer com ele. A constatação de que há muita coisa por detrás de um assunto não basta para justificar uma investigação do referido ponto. A primeira consideração que devemos fazer é se o Iceberg tem relação com os assuntos da clinica, pois o partilhante pode ter procurado o filosofo para resolver questões que passam longe desta. E, se o filosofo se encanta com algo simplesmente do seu interesse, pode desviar do que de fato está incomodando a pessoa, pode mexer em coisa que não deve e ainda deixar o partilhante sem resposta para o real motivo que o trouxe à clínica. Considero também uma falha ética o filosofo sair revirando coisas na vida do partilhante sem um fundamento para isso. Os procedimentos clínicos indicam um caminho e vamos junto com o partilhante por este caminho, a clínica não é um jogo onde se atira para todos os lados sem saber direito a finalidade. Vou dar um exemplo: Um partilhante procurou os serviços de um filosofo clínico porque tinha se aposentado e desde então não estava se sentido bem, logo de início apresentou um assunto: não sabia o que fazer com tanto tempo, o tempo estava lhe sobrando e a vida tornou-se um tédio. Estava saindo de uma rotina de 35 anos de trabalho, onde este ocupava todo o seu tempo. Agora, esta pessoa está sem o trabalho e precisa encontrar outra forma de viver. O filosofo vai auxiliar este partilhante seguindo os passos que estudamos até aqui. Será preciso que o partilhante conte toda sua história, serão feitos os dados divisórios e, os enraizamentos serão feitos nos pontos onde o filosofo encontre indícios de relação ou resolução do assunto trazido pelo partilhante. Entre outras coisas o partilhante falou durante sua historicidade sobre sua relação com a família, disse que, durante a adolescência teve grandes conflitos, onde as brigas foram constantes com pais e irmãos, até o dia que decidiu se mudar para bem longe e nunca mais procurar ninguém. Já fazem 25 anos que ele não fala com os pais, aliás, desconfia que estes nem estejam vivos e acha que não eram seus pais biológicos. Em nenhum momento demonstra dúvida quanto a eficácia da saída que encontrou para acabar com os problemas que vinha enfrentando. Veja bem, o assunto da clínica é a ociosidade do partilhante, a questão da família aparece como assunto resolvido. Imagine quanta besteira poderia fazer um profissional que tenha como Pré-juizo (tópico 5) que questões existências sempre encontram resposta na vida social e familiar (tópico 1 - Como o Mundo Parece). Seria um erro entrar por este caminho considerando os dados que temos até aqui. Para trabalhar a questão trazida pelo partilhante, poderemos encontrar alguma abertura em outros tópicos onde o Assunto poderá ser trabalhado de forma segura.

     

 
 
Como referenciar: "Relato do leitor" em Só Filosofia. Virtuous Tecnologia da Informação, 2008-2025. Consultado em 17/06/2025 às 04:05. Disponível na Internet em http://www.filosofia.com.br/vi_relato.php?id=34